domingo, 19 de junho de 2016

MAS AFINAL COM QUE RAIO DE TÁCTICA JOGOU PORTUGAL?


Após o bombardeamento de análises tácticas na comunicação social sobre o jogo Portugal-Áustria, ficámos convencidos que Portugal jogou num 4-3-3, com Quaresma e Ronaldo nas alas e Nani a ponta-de-lança.


Portugal em 4-3-3

Claro que num sistema móvel, em que Ronaldo saia da ala para se aproximar da área e Nani deambulava por todo o lado, enquanto Quaresma  ocupava a ala para cruzar. João Moutinho e André Gomes ocupavam os espaços interiores no meio campo.

Com esta análise levantou-se um coro de opiniões contra a mudança táctica de Fernando Santos. Não por Portugal ter jogado pior, mas porque tinha abdicado do modelo que tinha trabalhado durante toda a fase de qualificação e nos jogos particulares. 

No entanto, como Ronaldo raramente foi visto na ala esquerda, alguns analistas tiveram de encontrar uma resposta para o segredo do 4-3-3 sem ala esquerdo. Então, terá sido André Gomes a ocupar a ala esquerda e Ronaldo a jogar atrás de Nani. Numa espécie de 4-4-2  ao estilo de Jesus com João Moutinho a fazer de Adrien.

Portugal em 4-4-2 clássico


No entanto, hoje, aquele que melhor pode explicar em que sistema táctico Portugal jogou, nem mais nem menos que o próprio seleccionador, decide dizer isto (Cliquem aqui).

Parece que afinal, Portugal jogou no seu habitual 4-4-2 "mais" losango. Com Ronaldo e Quaresma na frente e com liberdade para caírem nas alas e abrir espaço para Nani a entrar por trás. Segundo Fernando Santos uma opção utilizada várias vezes durante a fase de apuramento.


Portugal em 4-4-2 "mais" losango


Então, porquê tanta confusão para definir uma coisa tão simples: com que táctica jogou Portugal?

Na minha opinião esta dificuldade tem origem em dois pontos:
O primeiro é um problema de fundo. A nossa comunicação social, e em especial os jornais desportivos, sofrem de uma ausência nos seus quadros de jornalistas e comentadores com compreensão do jogo que não se limite ao conhecimento superficial do simples adepto. 
Quantos jornalistas terão frequentando cursos, workshops ou simples conferências relacionadas com futebol ou arbitragem, de maneira a aumentarem o seu conhecimento, para quando comentam terem uma maior base técnica? Quantos leram um, um livro apenas,  sobre táctica e análise de jogo que não sejam as biografias de treinadores e jogadores?

Essa ausência de conhecimento faz que, numa situação em que Ronaldo, Quaresma e Nani joguem juntos, o resultado da observação é que Portugal terá jogado em 4-3-3, mesmo que a realidade depois contrarie essa evidência. Simplesmente porque é o mais óbvio.

As crónicas dos jogos nos jornais desportivos reflectem essa realidade de uma maneira confrangedora. Se puderem comparem com as crónicas do jornal "Marca" para terem uma ideia do que poderia e deveria ser uma crónica de um jogo nos jornais Portugueses.

O segundo ponto, no entanto é resultado de posicionamentos e dinâmicas de jogo confusas que fragmentaram o esquema estabelecido. 

Foram esses posicionamentos confusos que levaram Fernando Santos a definir o esquema como 4-4-2 "mais" losango. Aqui o "mais" está relacionado com "mais que um 4-4-2 clássico". No entanto esse "mais" denuncia o facto de não ter sido um verdadeiro 4-4-2 losango. Foi "mais" parecido mas não chegou a ser.

E porquê? Das duas uma, ou Fernando Santos criou realmente um novo sistema impossível de definir ou, o que me parece mais correcto, os jogadores não cumpriram as suas indicações. 

Alguma vez Quaresma esteve na posição de ponta de lança. Nani jogou por trás. Ronaldo abriu alguma vez na esquerda?
Dai a observação de Fernando Santos quando diz que às vezes os jogadores que jogam bem para os jornalistas não jogam bem para ele porque não cumprem as suas indicações.

E aqui residiu o problema com a selecção. 

Quando se coloca Quaresma na equipa uma coisa que não se pode esperar é rigor táctico, ainda para mais se lhe pedimos para ocupar espaços que nunca utilizou.
Desde os tempos do Sporting, Quaresma tem uma forma de jogar muito simples. Encosta-se à linha procurando receber a bola no pé e avança para o lateral no 1x1 para cruzar ou rematar. 

Ora mesmo que Fernando Santos tenha pedido para  Quaresma jogar ao lado de Ronaldo a verdade é que este não fez. Passou o tempo aberto junto à linha sem fazer movimentos interiores. Assim, Portugal na realidade jogou num 4-4-2 assimétrico.


4-4-2 assimétrico

Com Quaresma encostado na direita, Nani ocupou naturalmente o espaço que lhe estava destinado. André Gomes manteve os movimentos interiores deixando a ala aberta para as entradas de Raphael Guerreiro. 

Esses movimentos resultaram nas melhores ocasiões criadas por Portugal em futebol corrido.
Na primeira parte o remate de Ronaldo ao lado nasce de um lançamento longo de William Carvalho para Raphael Guerreiro que projectou-se na ala e depois combinou com André Gomes que ocupou um espaço mais central e assim arrastou o lateral com ele criando espaço para Raphael centrar junto à linha de fundo.
Este mesmo movimento é repetido na jogada que resulta no penalti. E só é pena que não tenha sido repetido mais vezes.

Este tipo de movimento permite centros para a área muito mais perigosos pois encontram o ponta de lança de frente para a baliza e nas costas dos centrais.



Ora já no lado direito os lançamentos e combinações encontraram Quaresma encostado à linha que procurou os cruzamentos sem no entanto conseguir ganhar a linha de fundo.  E além disso esse mesmo posicionamento bloqueou a projecção de Vieirinha que apenas apareceu  para apoio e rematar ou cruzar mas na cabeça da área. 

Esses cruzamentos encontraram quase sempre os centrais posicionados de frente para a bola sempre mais possibilidade de cortar.



Além disso Portugal apresentou pouca presença na área, em parte devido às características dos avançados que fogem daquela zona e também  porque o terceiro homem que deveria aparecer para criar superioridade numérica não estava lá. Nem Moutinho, nem André Gomes conseguiram ocupar a zona que estava destinada a Nani. 

Assim, voltámos a ter muitos cruzamentos e muitos remates mas, apesar de criarmos bastantes oportunidades, excluindo as acima referidas e os lances de bola parada, essas não foram resultado de jogadas trabalhadas mas sim de lances fortuitos.

Tivemos o remate de Nani que resulta de um lançamento de linha lateral de Ronaldo. Única situação criada de 1x1 com guarda redes. 
O remate de Ronaldo de fora da área que criou perigo mais pela espontaneidade do que por encontrar  espaço livre.
Um cabeceamento de Ronaldo fora da pequena área a cruzamento de Quaresma que criou perigo pela capacidade individual do Ronaldo pois a zona onde caiu a bola é muito distante.

De resto, só oportunidades de bola parada. Pouco, muito pouco.

E agora?

Bem a adivinhar pelo discurso de Fernando Santos, que disse que não deveríamos ter medo de jogar feio,  não basta sermos a equipa que mais cruzou e que mais rematou sem resultados práticos. Parece que a equipa está a preparar-se para enviar ainda mais bolas para a área e como o próprio diz criar "confusão".

Ou Fernando Santos ganha a coragem de sentar Nani ou Quaresma no banco e colocar a equipa a jogar num verdadeiro sistema de jogo ou vamos ter de esperar por Deus. Pode dar resultado como podemos regressar a Portugal com a sensação de 2002. Uma excelente selecção um péssimo seleccionador.



  


quarta-feira, 15 de junho de 2016


O PROBLEMA DANILO, A ILUSÃO SANCHES

Danilo perdido

Neste momento Danilo é o problema da selecção. Ou "um dos" pelo menos. Não por ser bom ou mau jogador, não por estar em boa ou má forma. Não por ter feito um bom ou mau campeonato.

Danilo é o problema porque a suas características não se enquadram com o modelo de jogo que os restantes jogadores da selecção requerem.

Dono de uma estampa física de meter respeito, forte nas bolas divididas, provavelmente o segundo atrás de Pepe na discussão das bolas aéreas, em teoria a presença de Danilo no onze titular faz todo o sentido. A sua presença permitiria discutir a primeira bola bombeada para o meio-campo de Portugal e contrariaria a força física da Islândia.

Contudo uma das características que Danilo não tem é a capacidade de distribuição de jogo na primeira fase de construção, ou pelo menos uma capacidade que permita alterações de ritmo, de profundidade e de rotura.

Ora para contornar esta limitação Portugal procurou três soluções: a saída pelos laterais, o que obrigava a não se projectarem tanto para poderem estar no inicio da construção, a saída pelos centrais, que pelas características destes resultava quase sempre em bolas bombeadas para as costas da defesa onde estas tinham vantagem, e a principal solução que passava por baixar João Moutinho para ser este quem iniciava a fase de construção.

Ora o problema é que baixando Moutinho para o lado de Danilo ficávamos de imediato com quatro jogadores fora das linhas da Islândia: os dois centrais, Danilo e João Moutinho.

Como os laterais não se podiam projectar muito porque poderiam ser necessários para a construção de jogo, nem João Mário nem André Gomes tinham apoios para poderem fazer movimentos interiores o que obrigou-os a ficarem encostados às linhas na primeira fase de construção.

Ronaldo não tem as características de recuar e jogar de costas para a baliza, tabelando com os colegas e Nani ocupava a função de ponta de lança procurando espaços de rotura entre os centrais.

Ora o que isto provocou foi um enorme espaço vazio à frente de Moutinho. Quando Moutinho recuava para iniciar a construção olhava para a frente e procurava um jogador que fizesse movimentos entre linhas, recebesse a bola de costas para tabelar ou para procurar passes de rotura no bloco central. Mas esse jogador não estava lá, porque esse jogador deveria ser o próprio Moutinho, que no entanto estava preso às funções de construtor devido à incapacidade de Danilo.

Não é à toa que vimos inúmeras vezes Roaldo a tentar descer para pegar jogo mas sem sentido e sem utilidade porque essas não são as suas características. Não é à toa que vimos Pepe a fazer lançamentos para a área e não é à toa que todo o jogo assentava numa circulação inócua em U, resultando em muitos remates mas quase todos de fora de área sem ser resultado de passes de rotura.

Ora se a presença de Danilo provoca este problema na fase de construção, seria importante que marcasse a diferença na luta aérea pela primeira bola. Mas infelizmente nem nesse momento do jogo mostrou-se capaz de impor a sua presença perdendo inúmeras bolas, sendo a mais importante a que resultou no golo da Islândia.

No entanto, está-se a formar a ideia de certo modo bem vinda pela comunicação social, de que o problema foi Moutinho e de que o que a selecção necessita é de alguém que com bola no pé e a partir de trás queime linhas e provoque ruturas. Esse alguém seria Renato Sanches.

No entanto, esse seria um equivoco maior que o de Danilo. Não por Renato não ser bom jogador ou não provocar esses espaços. Mas porque com Renato a equipa parte-se quando em transição e apesar de provocar ruturas a equipa perde o controlo do jogo porque entra num jogo de recupera,perde,recupera bola. Apesar de ter agitado o jogo, após a sua entrada a selecção não mais controlou o jogo como o fez na primeira parte. Foi incapaz a partir desse momento de encostar a equipa da Islândia lá atrás e circular a bola como seria necessário e como fez a Espanha mesmo até aos 87 minutos. Em vez disso tivemos arrancadas e iniciativas que são vistosas mas que redundam em nada a não ser a entrega da bola  ao adversário mais rápido e com a nossa equipa desposicionada.

O que Portugal necessita é de um trinco que assuma a primeira fase de construção, capaz de controlar os tempos e de fazer rodar o jogo permitindo iniciar uma construção a três e libertar os laterais para se projectarem  e ocuparem as faixas e fazendo os médios derivarem para o meio onde com o apoio de Moutinho garantem superioridade numérica. Esse jogador é William Carvalho.

E se a questão é as bolas aéreas, bem a verdade é que mesmo com Danilo mais valia assumir  a perda da primeira bola e colocar um jogador só para importunar na disputa da primeira bola e baixar mais o trinco para criar superioridade na disputa da segunda bola.

Não quer isto dizer que Danilo e Renato não serão úteis para Portugal. Apenas que nestes jogos em que as equipas se fecham lá atrás mas têm um bocadinho de mais talento que a estónia utilizar um trinco como Danilo é estar a jogar com menos um na fase de construção. Com equipas mais fortes que pressionem Portugal mais à frente ai sim Danilo e Renato Sanches fazem sentido pois podem esticar mais o jogo.

Sobre Moutinho gostaria de deixar uma pequena nota. Creio que a ideia de Moutinho ter feito um péssimo jogo resulta mais de uma questão de posicionamento de que de uma questão de forma. Se Moutinho jogar mais à frente a capacidade de receber e circular a bola entre linhas virá ao de cima e veremos ai se está ou não em boa forma.

No entanto caso se verifique que não é uma questão de posicionamento a alternativa mais credível será sem dúvida Adrien. Nem Renato, nem Rafa, nem Quaresma. Talvez Nani mas ai ficamos com um problema no ataque, pois apesar dos ultimos jogos de Quaresma ele não ocupa os mesmos espaços que Nani tem ocupado.